terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Aviador de histórias reais


Para Edvaldo, a missão do jornal impresso é ajudar o leitor a compreender o fato

Emanuela Barretto

Edvaldo Pereira Lima é uma das maiores referências sobre o Jornalismo Literário no Brasil. Quem é ou pensa em ser jornalista dificilmente não lê um de seus clássicos o ‘Páginas Ampliadas’. Edvaldo que também é um dos criadores da Academia Brasileira de Jornalismo Literário esteve na última semana em Pouso Alegre para ministrar uma palestra na Univás. O menino que deixou de sonhar em ser aviador por causa da miopia é hoje jornalista, escritor, professor, mestre e doutor em comunicação. Mas, não é com pose de quem carrega todos esses títulos que Edvaldo me concede à entrevista. Sentado, à vontade, entre um tira gosto e outro durante o jantar, como quem conversa informalmente na mesa de um bar, é que ele fala sobre sua vida, carreira, e claro, sobre sua grande paixão, o Jornalismo Literário.

Emanuela Barretto - Como surgiu a idéia de se criar a Academia de Jornalismo-literário?
Edvaldo Pereira Lima - Meu contato com Celso Falaschi surgiu quando ele foi fazer pós-graduação e foi meu aluno. A partir daí, nós dois ficamos muito amigos. Quando ele orientou o projeto experimental do aluno, Rodrigo Stucchi, que era a criação de um site que trouxesse só JL, aí nasceu o portal Texto Vivo até 2004. E em 2006, eu e Celso discutimos e vimos que não existia uma pós-graduação totalmente voltada para JL, então pensamos em criar essa pós, e para isso criamos a ONG, a Academia de Jornalismo Literário.

Emanuela Barretto - Como professor de especialização, mestrado e um dos criadores da Academia Brasileira de Jornalismo-Literário como você avalia o ensino do Jornalismo-literário na graduação? Você acredita que os alunos têm realmente contato o mundo de possibilidades que esse Jornalismo pode oferecer?

Edvaldo Pereira Lima - Pensando de modo geral, não. Mas, hoje eu vejo que já se inicia uma grande abertura para o ensino do JL, nas faculdades do Brasil. Vejo muitas universidades que tem o JL em sua grade. Mas, o importante é que se tenham professores especializados nessa área, só assim, haverá realmente ensino de Jornalismo Literário. Hoje também o mercado para JL está crescendo muito, o que acaba incentivando e de certa forma pressionando as universidades para essa formação.

Emanuela Barretto - A discussão sobre o fim ou a desvalorização do jornalismo impresso após o advento da Internet é antiga, mas, ainda surge, e vimos que o número de leitores dos grandes jornais impressos do país é pequeno se comparado aos meios eletrônicos. Você acredita que o jornalismo–literário seria uma alternativa de se encontrar novos caminhos para o jornalismo impresso diário?

Edvaldo Pereira Lima - Existe hoje no mundo uma crise dos leitores, porque durante muito tempo foi priorizado o jornalismo diário, imediato e agora, os jornais impressos, é claro, perdem público. Vejo que agora, a missão do jornal impresso é ajudar o leitor a compreender o fato, a notícia, porque a informação do fato em si ele já teve pela televisão ou pela internet, primeiro. Agora a missão do impresso é outra. Uma pesquisa americana feita em 2001 mostrou que os leitores estavam cansados da forma como o jornalismo era apresentado, e mais ainda, o público estava cansado da quantidade de notícias com teor negativista. A pesquisa concluiu que o público desejava ver nos jornais menos notícias sobre as celebridades e mais histórias de vidas de pessoas comuns. Também existe muita coisa boa acontecendo por aí. Ver as pessoas como personagens e não apenas como fontes. E o público brasileiro também já está começando a pensar assim. Se você for a qualquer cinema em São Paulo, pelo menos uma vez ao dia, é exibido algum documentário brasileiro isso reflete uma necessidade, um desejo do público de ver essas histórias reais e comuns contadas de forma especial.

Emanuela Barretto - E na imprensa de interior, onde normalmente as redações são menores e o deadline dos repórteres é mais apertado. Como você acredita que esses profissionais possam buscar novos olhares para suas fontes e enfoques mais humanizados?

Edvaldo Pereira Lima - Não é possível que aqui em Pouso Alegre, por exemplo, não haja nada de bom sendo feito. É possível fazer Jornalismo Literário em qualquer lugar, com qualquer tema. Não existe tema ruim. Desde que se conheça o JL é possível sim. E essa conversa de que JL deve ser feito com textos muito longos não faz sentido, o JL pode ser feito em textos de 500 palavras até. Eu tenho certeza que em Pouso Alegre devam existir personagens que renderiam grandes histórias.

Emanuela Barretto - Jornalismo-literário, Literatura de Não-Ficção e Literatura de Realidade são maneiras de se fazer jornalismo mais profundo e humanizado. Mas, explorando um pouquinho seu lado “professor”, você poderia explicar se há diferença conceitual entre os termos?

Edvaldo Pereira Lima - Não, realmente não há diferença no conceito. Esses termos foram surgindo ao longo do tempo. Literatura de Realidade, por exemplo, nasceu porque o Gay Talese trabalhava no New York Times, quando começou o movimento que ficou conhecido como Novo Jornalismo, alguns jornalistas quando viam seus textos diziam que aquilo não era jornalismo que estava muito mais para literatura. Então Gay chegou e disse – bom, já que o que eu faço não é jornalismo então é uma Literatura da Realidade. O que me parece ser realmente a descrição do que é o jornalismo realmente.

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